A saúde humana depende da saúde do Meio Ambiente e vice-versa. Como esses setores se relacionam, especialmente com as mudanças climáticas?
por Henrique Barbosa, Núcleo de Advocacy, Ações e Parcerias
Arredores do Parque Distrital Boca da Mata, entre Samambaia e Taguatinga, no Distrito Federal.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), aproximadamente 24% da carga global de doenças e 23% das mortes prematuras podem ser atribuídas a fatores ambientais modificáveis, entre os quais podemos citar a qualidade do ar, a água que bebemos, nossa alimentação e sua forma de produção, bem como a ocupação de moradias e terras no contexto urbano e rural. O Relatório Lancet Countdown 2022 destaca a forma como a saúde pública está intimamente associada à maneira como lidamos com o meio ambiente, e a importância da mobilização adequada de recursos para garantir a eficácia das políticas públicas.
No Brasil, de acordo com o IBGE, milhões de pessoas ainda vivem sem acesso a um sistema de saneamento básico adequado: 49 milhões sem descarte de esgoto, 33 milhões sem acesso à água potável e 18 milhões sem coleta de lixo. Além disso, doenças respiratórias, cardiovasculares, infecciosas e parasitárias persistem em alta. Doenças respiratórias causaram mais de 1 milhão de óbitos no período de 2008 a 2021, 400 mil pessoas morreram no Brasil devido a problemas cardiovasculares apenas em 2022 (FLORESTI, 2024), e 40,5% dos municípios brasileiros apresentam criticidade alta ou muito alta em relação à incidência de doenças infecciosas e parasitárias.
Esses números tendem a piorar, principalmente em estados e populações mais vulneráveis aos eventos climáticos extremos. A falta de acesso ao saneamento básico, a marginalização de suas moradias em zonas de sacrifício sujeitas a riscos e danos ambientais, e a falta de segurança alimentar de determinados grupos sociais, especialmente no que se refere à desigualdade econômica, reduzem sua capacidade de adaptação e resiliência no contexto da emergência climática.
Sendo assim, esses grupos se tornam vulneráveis a diversos eventos naturais que têm sido afetados pelas mudanças climáticas, bem como às Doenças Socialmente Determinadas associadas a esses eventos. O regime incerto de chuvas, associado à falta de infraestrutura, promove enchentes, riscos às habitações precárias e a proliferação de vetores de arboviroses e doenças parasitárias. Episódios de temperatura extrema e a exposição à poluição do ar, por sua vez, têm agravado a incidência de doenças infecciosas, pulmonares e coronárias.
Exemplos de doenças socialmente determinadas são malária, tuberculose, hanseníase e chagas. Se enquadram nessa categoria por afetar, intensa e majoritariamente, populações vulnerabilizadas socialmente.
Com a degradação ambiental crescente, a poluição atmosférica recorrente e a capacidade limitada de lidar com eventos climáticos extremos, a erradicação desses problemas se torna um desafio ainda maior. É necessário, então, reconhecer as interrelações entre biodiversidade, clima e saúde no contexto da Saúde Única e Planetária.
Dessa forma, a mobilização de múltiplos setores, disciplinas e comunidades para trabalhar juntos, com o objetivo de equilibrar de forma sustentável e otimizar a saúde das pessoas, dos animais, das plantas e dos ecossistemas, é crucial. Isso inclui promover o acesso equitativo a ferramentas, tecnologias e infraestruturas verdes, como medicamentos, vacinas, alimentos saudáveis e outros produtos sanitários relacionados com a biodiversidade.
A partir disso, torna-se evidente a necessidade de um novo paradigma pautado num modelo de desenvolvimento socioeconômico sustentável e inclusivo, que promova a conexão humana com a natureza através de comunidades mais verdes e saudáveis. É primordial reduzir as pressões sobre a biodiversidade, diminuir a degradação do meio ambiente e mitigar as emissões de gases de efeito estufa para reduzir os riscos para a saúde.
Além disso, promover a segurança alimentar através de uma produção sustentável de alimentos, garantir o acesso a serviços essenciais, conceber disposições práticas de acesso e distribuição de benefícios, bem como a erradicação da pobreza em suas diversas formas, são alguns dos pontos principais que devem permear as estratégias nacionais e globais de desenvolvimento sustentável e de promoção à saúde pública.
Aprofunde a leitura!
FIOCRUZ. O que a sua saúde tem a ver com a natureza. Disponível em: https://www.bio.fiocruz.br/index.php/en/noticias/3227-o-que-a-sua-saude-tem-a-ver-com-a-natureza.
FIOCRUZ. Eventos Extremos: Doenças e Perguntas. Disponível em: https://climaesaude.icict.fiocruz.br/doencas/eventos-extremos.
FLORESTI, F.. Cerca de 400 mil pessoas morreram em 2022 no Brasil por problemas cardiovasculares. Revista Pesquisa FAPESP, 2024. Disponível em: https://revistapesquisa.fapesp.br/cerca-de-400-mil-pessoas-morreram-em-2022-no-brasil-por-problemas-cardiovasculares/.
G1. Mapa do saneamento no Brasil: dados do Censo 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/censo/noticia/2024/02/23/mapa-ibge-saneamento.ghtml.
ICLEI. A visão de sustentabilidade de São Paulo: vinculando saúde, resiliência e acesso a alimentos. Disponível em: https://americadosul.iclei.org/a-visao-de-sustentabilidade-de-sao-paulo-vinculando-saude-resiliencia-e-acesso-a-alimentos/.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo 2022: rede de esgoto alcança 62,5% da população, mas desigualdades regionais e por cor e raça persistem. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/39237-censo-2022-rede-de-esgoto-alcanca-62-5-da-populacao-mas-desigualdades-regionais-e-por-cor-e-raca-persistem.
INSTITUTO DE ESTUDOS AVANÇADOS - USP. O que é Saúde Planetária?. Disponível em: https://saudeplanetaria.iea.usp.br/en/o-que-e-saude-planetaria/.
LANCET COUNTDOWN. Resources: Policy Briefs and Country data sheets. Disponível em: https://www.lancetcountdown.org/resources/.
LEMOS, D.A.. Doenças respiratórias no Brasil: impacto das internações e mortalidade. Dissertação (Mestrado em Ciências da Reabilitação) - Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2023. Disponível em: https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/52702.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Infográfico: Doenças Socialmente Determinadas. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/svsa/infograficos/infografico-doencas-determinadas-socialmente.png/view.
SOUZA, H.P.; de OLIVEIRA, W.T.G.H.; dos SANTOS, J.P.C.; TOLEDO, J.P.; FERREIRA, I.P.S.; de SOUSA ESASHIKA, S.N.G.; de LIMA, T.F.P.; de SOUSA DELÁCIO, A. Doenças infecciosas e parasitárias no Brasil de 2010 a 2017: aspectos para vigilância em saúde. Rev Panam Salud Publica. 2020. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7008608/.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. Preventing disease through healthy environments: a global assessment of the burden of disease from environmental risks. 2016. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9789241565196.
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